07 de Maio de 2024 - 08h:44

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Nova onda de recuperações judiciais afeta investidores

Crise na Starbucks leva fundos a baixar perda e Dia é quase metade de calote de veículo; situação da Casas Bahia preocupa setor

Por: Valor Econômico

A mais recente onda de recuperações judiciais de redes varejistas e de alimentação levou fundos imobiliários a novas perdas, e a hipótese desta lista de empresas voltar a crescer levantou o alerta entre gestoras expostas a ativos com maior risco.

 

Nos últimos meses, a rede de supermercados Dia e as operações geridas pela SouthRock Capital (Starbucks e Subway) entraram em recuperação judicial. A varejista Polishop solicitou, em abril, antecipação dos efeitos da recuperação, de forma a preparar o seu processo na Justiça, e a Casas Bahia teve aprovado, na semana passada, o pedido de recuperação extrajudicial.

 

As varejistas, assim como montadoras de automóveis e empresas de logística, estão entre os principais inquilinos desses fundos, e a inadimplência nos pagamentos de alugueis leva a baixas nos portfólios e cobranças das perdas. O comércio responde, em média, por cerca de 1/3 da receita de locação nos fundos imobiliários no país, pelo cálculo das gestoras.

 

A XP Vista Asset, gestora do XP Log FII - com mais de 340 mil cotistas - diz em seu último relatório que o Dia, em recuperação judicial há um mês e meio, está inadimplente com o pagamento do aluguel de fevereiro de um centro de distribuição em Americana (SP).

 

O Valor apurou que o pagamento de março, a ser feito em abril, também não ocorreu.

 

A empresa ainda está com valores em aberto de parcela mensal de multas pela rescisão antecipada do contrato de aluguel de um galpão em Ribeirão Preto (SP) - imóvel hoje locado ao Atacadão. Na lista de credores do Dia, a cadeia informa R$ 7,2 milhões em títulos em aberto com o fundo.

 

Em março, último relatório do fundo, a inadimplência total do XP Log FII atingiu 12,2% da receita de locação mensal, e quase metade disso vinha do Dia. Procurado, o fundo não se manifestou.

 

No mesmo dia em que a supermercadista pediu recuperação, em 21 de março, outro fundo, o VBI Logístico, informou aos investidores a rescisão antecipada pela rede do contrato de locação de um centro de distribuição em Mauá (SP), e do não pagamento de aluguel passado. O Dia era 5% da receita do fundo. São R$ 7,3 milhões em títulos em aberto com a VBI pela lista de credores. Até abril, a área continuava sem novo inquilino.

 

Na semana passada, a questão dos efeitos da crise das varejistas voltou a ser foco de debate no mercado, depois que a Casas Bahia pediu recuperação extrajudicial.

 

Analistas passaram a levantar quais eram os fundos imobiliários expostos à operação da rede, que aluga centenas de imóveis pelo país. Entre eles, há o XP Log (XPLG11) - o mesmo que alugava imóveis para o Dia - além do HSI Log (HSLG11), CSHG Logística (HGLG11) e do BTG Corporate Office Fund (BRCR11).

 

De forma espontânea, a gestora HSI (HSLG11) veio a público, na terça-feira (30), esclarecer em nota que a decisão da Casas Bahia não afetará a relação entre as partes e as condições do contrato com o fundo. Ocorre que, para analistas, não é possível avaliar a situação só de forma momentânea.

 

“Caso a ‘Bahia’ não volte a ser lucrativa após a recuperação, e isso ainda é dúvida, o negócio pode acabar comprometido, e mais fechamentos de imóveis não estão descartados”, diz um analista de banco. Em 2023, 55 lojas foram fechadas e, para ganhar eficiência, galpões locados podem ser renegociados, já informou a rede.

 

São 36,5 mil cotistas no fundo e 38% da receita contratada do veículo vem da Casas Bahia, o maior percentual da carteira, na frente apenas de outra varejista, a Bemol, rede de Manaus (AM) que também atua em eletrônicos, duramente afetado pela queda no consumo.

 

Os demais fundos, perguntados se também irão se manifestar proativamente sobre a questão da Casas Bahia, não comentaram.

 

Outro caso envolve o FII Riza Akin, da Riza Asset, relativo aos ativos da SouthRock.

 

O fundo esclareceu em relatório, logo após a SouthRock pedir recuperação judicial, em novembro, que os títulos de dívida da Starbucks, distribuídos no portfólio do fundo, estavam em situação regular. Mas mudou o posicionamento semanas depois. Eram cerca de R$ 50 milhões desses papéis na carteira em 2023.

 

Entendemos que o varejo é vivo e a demanda por bons pontos ainda existe” — Alexandre Rodrigues
A empresa SRC 6 Participações, dos mesmos sócios da rede de cafeterias, é a devedora numa operação envolvendo certificados de recebíveis imobiliários (CRI) da Starbucks, hoje na carteira do fundo.

 

Ocorre que, em seu último relatório ao mercado, de março, os gestores disseram que a SRC 6 passou a ficar inadimplente a partir do fim de novembro.

 

O fundo fazia a ressalva de que os CRIs e as garantias dos títulos não estão sujeitos à recuperação, mas foi precisou agir para obter as garantias relativas ao atraso de novembro. Aquelas relativas a outros meses ainda estavam em fase de execução em março, e a gestora, então, foi obrigada a baixar a provisão para devedores duvidosos desses ativos, equivalente a 25% do valor de face da dívida em março.

 

Outra baixa relativa a SouthRock veio de um fundo de direito creditório (Fdic) gerido pela Riza, o Riza Meyenii Fidc, que teve que provisionar a perda. Último relatório do fundo, de março, relata que da provisão total de 9,2% do patrimônio líquido em 2023, mais da metade veio das redes da SouthRock, seguido da cadeia de moda Amaro, também em recuperação judicial.

 

A gestora fala na carta a investidores que vê “expectativa de evolução nos processos” e recuperação das perdas.

 

Na visão do sócio e gestor do FII Rio Bravo Renda Varejo, Alexandre Rodrigues, apesar do ambiente de incertezas recente, o momento do mercado é positivo. “Entendemos que o varejo é vivo, ativo e extremamente dinâmico. Temos contato constante com grandes varejistas e nossa percepção é que a demanda continua existindo. As empresas continuam buscando bons pontos e boas estruturas”, diz ele.

 

Rodrigues cita a troca de inquilino num imóvel em Belo Horizonte em março - houve a saída do Santander e entrada da supermercadista Super Nosso no fundo que ele gere. Relatório ao mercado mostra que o imóvel não chegou a ficar vago, mostrando existência de demanda, diz ele.

 

Outro veículo, o fundo imobiliário Brasil Varejo, da Rio Bravo, com 73 cotistas, chegou a locar 40 lojas para a Marisa em 2023, mas 19 foram devolvidas pela rede no ano passado e uma neste ano - a Marisa chegou a responder por 80% da receita com locação. Em parecer da auditoria do fundo, a RSM, datada de 19 de abril deste ano, os auditores dizem que existia um trabalho de busca de novos inquilinos ainda em andamento, e que os ativos também poderiam ser vendidos.

 

Operações de locação com fundos se transformaram numa forma de expandir geograficamente de forma rápida e com ativos bem localizados. Além disso, a modalidade de venda do imóvel das varejistas ao fundo, com a loja alugando-o de volta, cresceu aceleradamente nos últimos anos. Isso porque o varejo passou a precisar de caixa após a pandemia, enquanto os fundos, com liquidez alta até 2022, caçavam bons pontos.

 

Imagem: Freepik

 

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